Raphaella Sconetto
O Distrito Federal vem passando por extremos climáticos neste ano: recorde de calor, umidade relativa do ar cada vez mais baixa e, em seguida, tempestades avassaladoras. O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) aponta que não é possível prever alterações tão bruscas no tempo, principalmente no período de mudança de estação. Por isso, as transições climáticas pegam todos de surpresa. Ao longo desta semana, o Jornal de Brasília aprofunda o debate acerca dos fenômenos que têm impactado diretamente no nível dos reservatórios e provocam a crise hídrica.
As chuvas que caíram na última quinzena não foram suficientes para amenizar a escassez de água na capital, que se agravou após uma estiagem de mais de 120 dias. Os reservatórios seguem em baixa. Ontem, na última medição feita pela Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (Adasa), a barragem do Descoberto estava com apenas 5,8% do volume útil. Já o reservatório de Santa Maria operava com 22,3%.
Neste ano, choveu 57% do que era esperado até agora, de um total de 1.540,6 mm. A chefe da Unidade Estratégica de Clima da Secretaria de Meio Ambiente, Leila Soraya, confirma que as chuvas que caíram até agora não conseguem encher os reservatórios. “Pelo contrário, são precipitações que causam desastres e não reservam água. Ela vem concentrada e intensa”, explica.
Além disso, ela explica por que as chuvas serão insuficientes. “Esse período de chuva não vai conseguir aumentar o volume porque não só a água da superfície está baixa, mas os lençóis freáticos, o subterrâneo, também está com um nível baixo”, aponta.
Para complicar ainda mais a situação das barragens, Leila completa que em janeiro a estiagem volta novamente. “Além de fecharmos o ano com chuvas abaixo do que era previsto, vem o verão e retorna a seca no Distrito Federal”, reitera.
As chuvas não são as únicas culpadas pelo baixo volume dos reservatórios. Ainda de acordo com Leila, é preciso analisar dois tipos de fatores: os climáticos e não climáticos. “Nós estamos saindo de três anos seguidos de seca severa. Leva um tempo para que os reservatórios comecem a minar e produzir água. Precisaria de muita chuva, e essa chuva não vai vir. Então, vamos continuar no déficit”, levanta.
População aumenta, ao contrário do investimento
Diversos fatores não climáticos contribuem para as mudanças: “Aumento da população, a própria gestão, a impermeabilização do solo, o investimento público em projetos que não produzem água e aumentam a nossa vulnerabilidade à seca, expansão imobiliária e rodoviária”, detalha Leila Soraya, da Secretaria de Meio Ambiente.
“Quando o gestor tem um problema que acha que pode provocar um colapso na economia, ele incentiva a criação de empreendimentos. Se ele toma essa decisão sem olhar para os fatores climáticos, aumenta ainda mais as chances de os extremos se repetirem”, completa.
O meteorologista Mamedes Luiz Melo, do Inmet, observa que já foi iniciada a época de transição de estação. “Estamos caminhando para o verão. Então, quando as precipitações dão uma trégua de três a quatro dias, a próxima chuva vai encontrar um ambiente quente, úmido, e é comum vir mais forte”, alerta.
Questionado se é possível prever mudanças climáticas tão bruscas, Mamedes afirmou que o modelo de previsão é um pouco falho. “Leva um certo tempo para detectar”, aponta.
O meteorologista ressalta que o País como um todo vem sofrendo com as mudanças climáticas. “Para saber como vai ser o ano que vem, a longo prazo, é preciso levar em consideração muitos fatores, desde a atmosfera até os oceanos, para ver se existe algum fenômeno em grande escala capaz de modificar”, explica. “O DF já vem sofrendo com a diminuição das chuvas desde o El Niño de 2014 e 2015”, completa.
Para os próximos dias, a previsão é de mais chuva na capital até o fim de semana. O céu ficará nublado a encoberto com pancadas em áreas isoladas. A temperatura vai variar entre 17 ºC a 24 ºC, e a umidade relativa do ar entre 95% e 50%.
SAIBA MAIS
Na próxima reportagem, o JBr. vai mostrar como a temperatura do Distrito Federal tem se comportado nos últimos 50 anos e quais são as projeções para o futuro.
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Por que estamos rumo ao limite? (versão impressa)